As relações do trabalho na atualidade

A narrativa do Evangelho de Mateus 20, 1-16
O Evangelista Mateus no capítulo 20 descreve a história de um homem que contrata para um dia de serviço funcionários para trabalhar na vinha. Diferente do que normalmente ocorre atualmente e, creio, aquela época também, o patrão chama em horários distintos desde a manhã até a tarde e paga o mesmo valor a todos ao final do dia.

Algumas situações do texto devem ter especial atenção.

O patrão que deveria assim ser chamado é o “pai de família” pelo texto. A postura dEle ao efetuar o pagamento ao final da tarde foi de que se chamassem os últimos a receberem antes dos primeiros. Evidencia, assim,
que queria que estes vissem que Ele pagou o mesmo “denário” a todos indiferente às horas trabalhadas. Poderia ter chamado os que trabalharam o dia todo primeiro evitando que estes vissem que receberam o mesmo valor. Agindo desta forma “murmuravam contra o pai de família” demonstrando que vários foram os insatisfeitos com a questão. Mas, Ele “disse a um deles” apenas que não fora injusto. Poderia ter revelado a todos ao mesmo tempo, mas quis que este para o qual Ele se justificou espalhasse a notícia da Sua bondade e narra o termo direito tão em voga na atualidade quando diz no versículo 15: -“Não tenho o direito de fazer o que quero com o que é meu?”.

Obviamente os textos bíblicos são possíveis de serem interpretados de diversas formas principalmente quando se refere à cultura daquele que os lê e interpreta. Mas, neste momento a reflexão circunda o capítulo no tocante ao trabalho na atualidade.

O capitalismo impõe regras a todos nós que em algumas situações levam à escravidão. Ultimamente e já a algum bom tempo muito se ouve sobre o ter direito. Hoje a população assiste ao mandamento do direito. Se tem direito a tudo e existem até advogados especializados em indenizações que buscam a todo tempo clientes que creem terem direitos para ganharem o pão de cada dia. Não que tudo esteja errado ou desonesto. Mas, percebe-se em vários casos a formação da indústria das indenizações. De forma equivocada muitos sucumbem ao discurso dos técnicos em leis sendo levados a agirem de forma inescrupulosa a buscar dinheiro.

Creio que em uma empresa caso haja pagamento igual a funcionários indistintamente ao horário ou dia que iniciaram suas atividades, o patrão poderia ser acusado pela indústria da indenização de ter produzido o assédio moral: A distinção entre pares a beneficiar uns em detrimento a outros. Mas, veja bem, somos leigos em legislação, mas o mercado já nos informou isto. Não que seja o ocorrido na narrativa de São Mateus, mas hoje em dia talvez fosse o “pai de família” acusado. Ao judiciário brasileiro caberia a avaliação, a sentença e, em sendo acusado, a aplicação da pena. Difícil saber o que ocorreria na sentença legal. Mas, de tudo o certo é que seria o “pai de família”, pelo menos, acusado e levado à defesa junto ao Ministério do Trabalho. A demonstração de transparência nos atos do “pai de família” evidenciados no Evangelho não seria suficiente para minimizar a acusação, mas pelo contrário, poderia até piorar a situação de assédio por querer que os outros que iniciaram nas primeiras horas do dia vissem, sentissem e percebessem que ganharam “menos” proporcionalmente aqueles últimos contratados.

O Evangelho de Mateus poderia propor que ao se deparar com divergências de um grupo ser salutar conversar com uma pessoa do mesmo ou uma comissão menor e não todos insatisfeitos quando narra no versículo 13: “Ele, então, disse a um deles: Amigo, não fui injusto contigo. Não combinamos um denário? Toma o que é teu e vai. Eu quero dar a este último o mesmo que a ti. Não tenho direito de fazer o que quero com o que é meu? Ou estás com ciúme porque sou bom?”. Desta forma, eles poderão repassar a informação aos demais. No caso do texto sagrado, a bondade do patrão.

De forma genérica o texto demonstra que princípios éticos pessoais podem ser soberanos aos julgados legais. Mas, infelizmente estes últimos devem ser seguidos mesmo que os julguemos errados. A lei do homem em muitas vezes impossibilita a benevolência e a caridade. Vi, certa vez, que não é bom um restaurante dar a tua sobra não servida nos pratos dos clientes a mendigos. Caso estes se sintam mal após a ingestão daquele alimento eles podem acusar o proprietário de servir alimento estragado e pleitearem pagamentos indenizatórios por isto. Mesmo que o mal tenha sido causado por outras situações ou até mesmo de não existirem tais situações.

A escravatura e mesmo os atos de Hitler foram permeados por fundamentação jurídica uma vez aprovada pelos governos quer sejam autoritários quer sejam democráticos, mas autorizados por eles. Era legalmente aceito agir daquela forma. Ninguém te puniria por estuprar a tua escrava. Ninguém o condenaria por espancar um negro. Ninguém o sentenciaria por matar milhões de judeus.

Mas, as leis mudam no decurso histórico. Novas culturas vão sendo incorporadas e o que é correto hoje pode não o ser amanhã. Assim foi com o nazismo e a escravidão. Atitudes jurídicas corretas à época e inadmissíveis atualmente. Na verdade repugnadas hoje em dia.

Pode ser aceito pela legislação que usinas hidrelétricas sejam hoje instaladas nos rios da Amazônia para suprir o déficit elétrico e proporcionar o crescimento econômico daquela área. A lei permite às vezes. Mas, daqui a alguns poucos anos esta postura pode ser também repugnada e inadmissível.

Certo é que a legislação a qualquer tempo deveria ser recheada de princípios cristãos. O seguimento a Cristo nos mostra ser doloroso, pois Ele mesmo feriu princípios jurídicos e fora condenado pela justiça humana a morte.

Comentários

Wesley Pereira disse…
Passo tempos sem vir aqui, e sempre que passo encontro textos maravilhosos, que me faz parar e refletir.

parabéns padrim por esse trabalho.
Sucesso sempre!!!
Obrigado, Wesley. Tá sumido mesmo, heim. Um grande abraço e não esquece do amigo aqui, ok?

Postagens mais visitadas deste blog

História na Faculdade de Odontologia - UFJF

Para onde vamos?

Comentário sobre a Encíclica "Spe Salvi"